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  • 04/04/2018 08:44
  • Jorge Avancini

PLANO SOCIAL NÃO É TÍQUETE DE TEMPORADA

Por Jorge Avancini
(Com edição de Ricardo Mituti)

 

Dois mil e dezoito sequer chegou à metade e alguns clubes brasileiros já fizeram ou estão fazendo alterações em seus planos sociais. Essas alterações vão da redução do valor das mensalidades ao seu, quase total subsídio, passando por descontos generosos no valor do  ingressos para uma ou mais partidas.

Tais ajustes evidenciam a crucial importância que os quadros sociais passaram a ter, nos últimos anos, para as finanças dos clubes. Além de gerarem novas e receitas, garantem uma entrada mensal muitas vezes considerável, fortalecendo o fluxo de caixa de toda uma temporada.

No entanto, algumas dessas remodelações nos planos de associação têm transformado-os em um tipo de “ingresso de temporada” - prática comum na Europa, pela qual o torcedor adquire, de uma única vez, todos os tíquetes de uma mesma competição, garantindo seu lugar no estádio independentemente da performance do time ao longo da temporada.

Se à primeira vista esta parece ser uma boa estratégia, à segunda arrisco dizer que ela me soa bastante equivocada: mensalidade de plano social não é ingresso de temporada.

O torcedor brasileiro não está habituado ao modelo europeu. Na verdade, só vamos ao estádio quando nosso time está bem e/ou em jogos importantes – de preferência, em semifinais e finais.

Evidentemente, há um grande número de torcedores que marca presença em qualquer situação. Mas, na média, a realidade é mesmo a que retrato – gostem ou não.

Nesse sentido, subsidiar o valor dos ingressos conflita com o ideal de contribuir mensalmente com o clube do coração, ainda que o momento do time não seja dos melhores. Este sim é o verdadeiro significado de um bom plano de associação.

A propósito, os modelos brasileiros foram criados no final dos anos 90. Na época, quase todos tinham como referência o exitoso plano do Benfica, de Portugal – então o maior quadro social do mundo entre os clubes de futebol.

O principal ideal do projeto português era conquistar a associação do torcedor a partir de uma perspectiva um tanto óbvia, amparada em paixão e fidelização eterna – esta última, característica que só o futebol oferece sem margens de erro: o torcedor contribui mensalmente para ajudar o clube e ganha o direito de participar de sua vida política (e do dia a dia como um todo). Neste cenário, ir ao jogo é apenas uma consequência natural.

Mesmo que os planos brasileiros tenham sido concebidos sobre essa base teórica, com o passar dos anos alguns dirigentes entenderam que, para manter estádio cheio em tempos de time sem perspectivas – e, assim, aumentar as receitas – era preciso reduzir o preço do ingresso. Na esteira, reduziam também os valores das mensalidades dos planos sociais ou criavam versões populares, cujo principal benefício era o subsídio do bilhete de acesso ao jogo.

Ora, de nada adiantam essas medidas se o clube não oferece um produto e um conteúdo de qualidade – ou seja, um belo espetáculo a cada partida.

Quando reduzem as mensalidades dos planos sociais, os dirigentes depreciam o produto e geram um déficit de caixa no médio e longo prazo. Isso acaba impactando as receitas do clube - e alguém, no futuro, terá de pagar a conta.

Antes de considerar baixar os valores - seja de ingressos ou, sobretudo, dos planos sociais -, o dirigente deve ter ciência que uma redução nas receitas por certo irá prejudicar a qualidade do espetáculo oferecido ao associado.

Nos casos em que o dinheiro do quadro social corresponde a grande parte do faturamento da agremiação, isso significa, também, não ter poderio financeiro para montar equipes vencedoras. Se um clube percorre este caminho, inevitavelmente acaba caindo no chamado ciclo vicioso.

O sucesso de um bom plano social depende muito mais da criatividade dos dirigentes do que de ações populistas, que custarão caro à instituição em algum momento.

Os sócios são o grande patrimônio dos clubes. Oferecer a eles vantagens e reconhecimento pela relação travada ao longo do tempo é mais do que normal e salutar; é obrigação. Mas apostar em medidas de curtíssimo prazo, desvirtuando o verdadeiro conceito do projeto de associação clubística, certamente irá fomentar hábitos nocivos à saúde financeira da agremiação, como inadimplência, obrigatoridade de perdão a dívidas e cobrança de ingressos a preços incompatíveis com o custo do negócio futebol dos tempos atuais.

Pensar sempre à frente é o segredo do sucesso do modelo.

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